O Estado de S.Paulo
Um dos escândalos mais notórios na escabrosa memória do furto de dinheiro público no Brasil - tornado conhecido pela sigla da instituição financeira lesada, o Banco do Estado do Paraná (Banestado), que era público e foi privatizado em 2000 - está se encaminhando para dar em nada. Ou, como se diz, "acabar em pizza". Decisão adotada em 19 de março pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) extinguiu as penas prescritas de 7 dos 14 ex-dirigentes da instituição condenados pela remessa fraudulenta de R$ 2,4 bilhões ao exterior nos anos 90.
Em 2003, uma força-tarefa investigou o esquema que transferia para 
paraísos fiscais os lucros da corrupção e do tráfico de drogas por meio de depósitos de doleiros em contas de laranjas e nas chamadas contas CC5 criadas para permitir transferência para o exterior. O ex-gerente de câmbio do Banestado na agência de Foz do Iguaçu, na fronteira com Argentina e Paraguai, Bendito Barbosa Neto, que passou 21 dias na cadeia em Curitiba e teve agora a própria pena prescrita, classificou a atuação do Banco Central (BC) no caso de "permissiva". Ele, cujo trabalho era informar o BC de todas as transações, justificou o uso da acusação com uma constatação: "O BC fez mudanças na lei, permitindo que qualquer pessoa fizesse depósitos em contas CC5 sem exigir comprovação da capacidade financeira". E mais: o encarregado de vigiar o uso da moeda corrente no País, segundo ele, "poderia bloquear as operações a qualquer momento, mas não fez isso".
A facilidade de abertura dessas contas promoveu uma verdadeira farra no setor de câmbio do banco paranaense. Doleiros de todo o País abriram contas em nome de laranjas no Banestado, principalmente no Paraguai, de onde o dinheiro era transferido para outros países sem que o BC tomasse conhecimento sequer de quem era seu titular. Mas a força-tarefa nunca teve dúvidas da cumplicidade de gerentes e diretores do banco, que, no mínimo, concordavam com a abertura das contas. Numa, um desempregado depositou R$ 15 milhões.
Foram abertos milhares de inquéritos em todo o País, com 631 pessoas denunciadas. Segundo o promotor de Justiça Silvio Marques, "boa parte do dinheiro desviado dos cofres públicos pelo ex-prefeito Paulo Maluf foi enviada ao exterior mediante contas do Banestado em Nova York".
Seu colega Vladimir Aras, que participou das investigações, lamentou a ocorrência da prescrição, mas esta decorreu da lerdeza com que a Justiça tratou o caso, exceção feita à primeira instância - o juiz Sergio Fernando Moro, da 2.ª Vara Criminal de Curitiba, só precisou de 12 meses para decidir: em 2004, os 14 acusados foram condenados a penas de até 12 anos e 8 meses na cadeia.
O mesmo, contudo, não pode ser dito das outras instâncias. A ação permaneceu cinco anos nas gavetas do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4.ª Região, em Porto Alegre, para julgamento de apelações da defesa. O TRF-4 absolveu os acusados do crime de formação de quadrilha e lhes reduziu significativamente as penas, além de ter dado uma contribuição importante ao transcurso de prazo para a prescrição das penas dos réus cuja condenação manteve.
De lá o processo subiu para o Superior Tribunal de Justiça que o reteve por mais três anos. A Procuradoria-Geral da República demorou um ano e três meses para emitir parecer. Completados dez anos da abertura das investigações, o STJ reconheceu a prescrição dos condenados a cumprir penas por gestão fraudulenta e evasão de divisas, acusações que pesavam sobre sete réus. Mais três respondem por gestão fraudulenta.
A força-tarefa bloqueou R$ 333,5 milhões no Brasil e mais R$ 34,6 milhões no exterior. O promotor Vladimir Aras comemorou o repatriamento de US$ 3,6 milhões. Qualquer quantia devolvida aos cores públicos é bem-vinda. Mas isso é relativo: primeiro, são migalhas comparadas com o total desviado. E, em segundo lugar, a impunidade dos larápios dificulta o longo, árduo e, como no caso, inútil combate contra a corrupção no Brasil.

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